Na noite de 30 de abril, o secretário de Economia Criativa e Fomento Cultural do Ministério da Cultura (MinC), Henilton Menezes, participou de forma online de um evento promovido pelo Instituto Cultural Ingá (ICI) para falar sobre a retomada da Lei Federal de Incentivo à Cultura, a chamada Lei Rouanet, responsável pelo financiamento de projetos culturais no Brasil.
Na ocasião, ele falou sobre a situação encontrada no início da gestão e traçou uma retrospectiva do que foi feito até então e do que se planeja fazer pro próximo ano. A conversa foi mediada pelo consultor estratégico do ICI, Miguel Fernando, e contou com a participação de internautas e dos produtores culturais convidados Caio Cesaro (de Londrina) e Marcelo Seixas. O presidente do ICI, George Coelho, reforça a importância de encontros como esses. “Precisamos estreitar as relações institucionais entre a cidade e os órgãos estaduais e federais ligados à cultura. É o ICI cumprindo mais uma vez o seu papel”, diz.
“A Lei Rouanet foi muito atacada com informações falsas e acusações de má fé, mas eu queria realçar a importância desse mecanismo e do ativo que é a Lei para a produção cultural brasileira. É a única lei de fomento e mecanismo de incentivo fiscal do país que não tem validade. A partir da década dos anos 2000, toda lei de incentivo fiscal nova tem uma duração máxima de cinco anos e a cada período precisa ser renovada. A nossa lei já tem 32 anos, passou por todos os governos e está sobrevivendo, apesar dos ataques”, comenta. Segundo Menezes, ao longo de mais de três décadas, a lei representou um investimento de 26 bilhões de reais.
No início do ano, entretanto, a situação encontrada pelo novo governo no Ministério da Cultura foi definida como “muito ruim” e “caótica”. Entre os problemas encontrados, estava uma quantidade muito grande de projetos pendentes de análise, dinheiro bloqueado nas contas, o sistema online para inscrição de projetos (Salic) alterado de forma equivocada, falta de pareceristas credenciados, uma Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC) - cuja função é ajudar na gestão do mecanismo - totalmente desestruturada e uma equipe interna de funcionários desmotivados, entre outros pontos.
Arrumar a casa
A partir de uma consulta pública relâmpago, foram feitas em tempo recorde as primeiras alterações na legislação. O Decreto nº 11.453/2023 foi publicado em 23 de março e a Instrução Normativa MinC nº 1/2023 em 10 de abril. “Quando começamos a desenhar o decreto para regulamentar novamente a Rouanet, os órgãos de controle do governo federal nos alertaram que era importante aproveitar para regular outras ferramentas de fomento. Passou a ser um decreto que criava um cenário jurídico favorável para a chegada das novas leis, a Paulo Gustavo e a Aldir Blanc”, conta, de modo que a legislação abordou a política cultural como um todo, trazendo novidades, como a prioridade para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. “Há o entendimento desse atual governo de que essas três regiões precisam ter uma ação que possa induzir investimentos nos estados que as compõe, porque historicamente são os estados que menos receberam incentivos fiscais ao longo desses 32 anos de existência da lei. A região Norte, por exemplo, recebe cerca de 1% do incentivo fiscal da cultura para sete estados, quase tudo (80%) concentrado no Pará”, revela Menezes.
Ao mesmo tempo em que eram feitas essas alterações, as plataformas informatizadas também eram ajustadas para funcionarem adequadamente. Foi resgatado um sistema Salic de 2018, visto que, no entendimento da equipe, o atual sistema não tinha condições de uso. Em 11 de abril a plataforma voltou a operar para receber novos projetos e, em seis meses, mais de 8 mil propostas foram inscritas, representando o maior recorde em toda a história da Lei e gerando uma grande demanda de trabalho.
Menezes afirmou que várias evoluções no sistema serão implementadas no próximo ano. “A gente pretende ter um Salic mais moderno e com mais funcionalidades e o sistema precisa traduzir a legislação. Cada mudança de IN, precisa mudar o sistema para as pessoas enxergarem as novas regras’, diz, anunciando que, em 2024, o prazo de inscrição de projetos deve acabar mais cedo, em 30 de outubro, para que ainda restem duas reuniões da CNIC que consiga analisar os projetos previstos para o início do ano.
Consulta pública e novos programas
Desde que saiu o novo decreto e a nova IN, o Ministério da Cultura está em diálogo com artistas, produtores e sociedade civil para debater a legislação publicada às pressas. “Fizemos isso porque tivemos muito pouco tempo de escuta da classe artística, porque se tivesse discussão preliminar teria atrasado muito e havia muita demanda de envio de projetos”, explica. Esse diálogo tem ocorrido por meio de reuniões descentralizadas e abertura de consultas públicas, como a que foi aberta semana passada, dia 01º/11, visando a elaboração da nova Instrução Normativa que será publicada em janeiro de 2024. A consulta ficará ativa até 15/11.
O MinC lançou dois novos programas importantes, iniciativas inéditas que tem como objetivo estimular e induzir a descentralização de recursos. O Programa Rouanet Norte, em parceria com quatro estatais (Banco do Brasil, Banco da Amazônia, Caixa Econômica e Correios), levará R$ 24 milhões que financiarão ações culturais propostas por agentes do Norte, realizadas nos sete estados daquela região. Junto com o programa, o Ministério irá promover treinamentos presenciais nas capitais para a elaboração de projetos, visando a inclusão e democratização de acesso. No início do ano que vem deve ser lançado um programa similar para o Nordeste.
Outra iniciativa é o Programa Rouanet nas Favelas, lançado há duas semanas. Já com um grande patrocinador (Vale), trata-se de um projeto piloto que será levado pros territórios de favela de cinco estados brasileiros (Bahia, Ceará, Maranhão, Pará e Goiás).
Menezes explica que a marca Rouanet está sendo sempre incluída junto ao nome dos programas com o objetivo de resgatar a credibilidade da lei. Também por isso foi criada uma nova marca.
Descentralização
Menezes ainda falou sobre a volta dos trabalhos itinerantes da CNIC. A comissão se reúne 11 vezes durante o ano e para 2024 deve fazer cinco itinerâncias, com uma reunião em cada região brasileira.
Outra estratégia é a abordagem do MinC para com as 50 maiores empresas patrocinadoras da cultura no Brasil, buscando incentiva-las a descentralizar seus patrocínios. Para o secretário, é fundamental promover encontros com empresários para ajuda-los a entender o mecanismo da renúncia fiscal e demover a lenda urbana de que é possível cair na malha fina ao patrocinar projetos via Rouanet. Nas reuniões itinerantes da CNIC está previsto esse momento de encontro, articulado com as secretarias locais.
Também há uma articulação do MinC para que a pessoa física consiga incentivar projetos no momento da declaração do imposto de renda em março / abril, em vez de ter que fazer no final do ano. Na visão do gestor, isso ampliaria a adesão de patrocinadores PF, pois apenas 1,5% dos patrocínios recebidos vem de pessoa física, sendo que 0,01% dos contribuintes PF que poderim investir acabam de fato investindo. Há, então, uma grande possibilidade de crescimento, que provavelmente ampliaria a captação de recursos nos municípios do interior.
No entanto, o secretário revela que o orçamento da Rouanet já está no teto. “Tenho um orçamento de R$ 2,2 bilhões e a nossa expectativa é que a captação chegue a 2 bilhões e meio, então não tem margem para onde crescer. Temos que fazer esse movimento da pessoa física associado ao aumento de limite”, comenta. Segundo ele, esse movimento já está sendo feito.
A conversa com Henilton Menezes está
disponível aqui.