Os membros da ABPA – Associação Brasileira de Preservação
expressaram a preocupação com a situação do patrimônio audiovisual brasileiro,
atualmente em grave risco, em especial o caso da Cinemateca Brasileira e
registraram na Carta de Ouro Preto 2020 da Temática Preservação a necessidade
de repensar o modelo de gestão via Organização Social para instituições de
patrimônio, uma tendência que vem sendo aplicada sem a compreensão do perfil e
das necessidades específicas de cada instituição. Além disso, no contexto de
celebração dos 70 anos da televisão no Brasil, também destaca a importância da
preservação da memória televisiva.
Reafirmaram a CineOP como o principal fórum para a troca de
experiências, proposição de políticas e formulação de ações relativas ao campo
da preservação audiovisual, a Carta incluiu também reivindicações do setor,
dentre as quais destacam-se: a construção de uma política pública para a área
tendo como base o Plano Nacional de Preservação Audiovisual; a reavaliação das
políticas de terceirização da gestão das instituições de patrimônio
audiovisual; o aumento da participação da sociedade civil e da comunidade
audiovisual nos colegiados da esfera federal para construção democrática de
políticas públicas de preservação audiovisual; a criação de mecanismos para a
ampliação da oferta de obras audiovisuais brasileiras nos catálogos de
plataformas de streaming, tendo a garantia de inclusão de obras de diversas
épocas; e a inclusão do setor de preservação audiovisual nas ações emergenciais
destinadas ao setor cultural devido à pandemia de Covid-19. Confira abaixo a
carta na íntegra.
CARTA DE OURO PRETO
2020 | PRESERVAÇÃO
A Associação Brasileira de Preservação Audiovisual – ABPA,
reunida de forma virtual em sua Assembleia Geral durante a 15ª CineOP – Mostra
de Cinema de Ouro Preto, expressa, primeiramente, toda a solidariedade às
vítimas da Covid-19 e suas famílias. A pandemia trouxe desafios para toda a
sociedade, para o audiovisual e para as instituições responsáveis pela
preservação do nosso patrimônio cultural, apontando para um período no qual
precisamos repensar formas de vida, processos de trabalho e a cadeia do
audiovisual como um todo.
Expressamos preocupação com a situação do patrimônio
audiovisual brasileiro, atualmente em grave risco, destacando o aprofundamento
da crise administrativa na qual se encontra a Cinemateca Brasileira, mais
importante instituição de salvaguarda da memória audiovisual do país. No
momento, a instituição está paralisada, não possui quadro técnico nem a
garantia de manutenção de sua estrutura física para a preservação e o acesso ao
acervo. A situação do audiovisual é dramática e espelha a necessidade e a
urgência de políticas públicas para o campo cultural no Brasil desde a extinção
do Ministério da Cultura em 2019.
Neste sentido, é preciso repensar o modelo de gestão via
Organização Social para instituições de patrimônio, tendência que vem sendo
aplicada sem a compreensão do perfil e das necessidades específicas de cada
instituição. O caso da Cinemateca Brasileira é um exemplo eloquente do fracasso
dessa forma de gestão, pois a estabilidade dos quadros funcionais, a autonomia
técnica e o exercício da missão institucional não foram assegurados.
A preservação do patrimônio cultural é dever constitucional
do Estado brasileiro e, portanto, é preciso recuperar o protagonismo do poder
público na gestão de instituições de patrimônio audiovisual, retomando os
processos de abertura de concursos públicos e de implementação de planos de
gestão pensados em conjunto com a sociedade civil, diretiva prevista na
Recomendação sobre a Salvaguarda e Conservação das Imagens em Movimento, da
UNESCO, de 1980.
Ao celebrar os 70 anos do início da televisão no Brasil,
destacamos a importância da preservação da memória televisiva, considerando os
três sistemas de radiodifusão (público, privado e estatal) previstos na
Constituição, e as expressões fundamentais de televisões comunitárias e
experimentais, arquivadas em emissoras, instituições de memória e organizações
da sociedade civil.
Elencamos, a seguir, alguns pontos urgentes para a
implementação de uma política nacional para a área de preservação audiovisual
no Brasil, assim como os desafios a serem enfrentados pelo nosso campo de
atuação:
– construir uma política pública para a área tendo como base
o Plano Nacional de Preservação Audiovisual, fruto da organização do setor ao
longo de anos;
– reavaliar as políticas de terceirização da gestão das
instituições de patrimônio audiovisual que estão em curso, caso da Cinemateca
Brasileira, ou em fase de planejamento, caso da Cinemateca Capitólio;
– reivindicar o aumento da participação da sociedade civil e
da comunidade audiovisual nos colegiados da esfera federal para construção
democrática de políticas públicas de preservação audiovisual, a exemplo do
Conselho Superior de Cinema e do Comitê Gestor do Fundo Setorial do
Audiovisual, para os quais a ABPA reitera a sua disponibilidade;
– solicitar a republicação do Edital SAv/MinC/FSA nº 24, de
27 de dezembro de 2018, linha de Restauro e Digitalização de conteúdos
audiovisuais, suspenso em 2019 sem maiores esclarecimentos da Secretaria
Especial de Cultura;
– reivindicar que, em atendimento à Resolução nº 10/2006, do
Conselho Nacional da Educação, os cursos de graduação em cinema e audiovisual
incluam a preservação audiovisual em seus currículos. Reiteramos a importância
do incentivo e abertura para projetos de pesquisa na área, sejam de iniciação
científica ou de pós-graduação. A ABPA coloca-se à disposição das
universidades, da Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual
(SOCINE), do Fórum Brasileiro de Ensino de Cinema e Audiovisual (FORCINE), e de
outras iniciativas de formação na área;
– defender a importância da manutenção da cota de tela na
televisão e no cinema, hoje sob ameaça;
– reivindicar a criação de mecanismos para a ampliação da
oferta de obras audiovisuais brasileiras nos catálogos de plataformas de
streaming, tendo a garantia de inclusão de obras de diversas épocas,
possibilitando o acesso ao vasto patrimônio audiovisual brasileiro;
– incluir o setor de preservação audiovisual nas ações
emergenciais destinadas ao setor cultural devido à pandemia de Covid-19, de
acordo com a Lei nº 14.017 de 29 de junho de 2020, conhecida como Lei Aldir
Blanc;
– integrar e fomentar redes colaborativas entre instituições
de memória e preservação audiovisual, e também projetos de pesquisa transnacionais
com ênfase regional na América Latina.
Reafirmamos, por fim, o espaço da CineOP – Mostra de Cinema
de Ouro Preto como o principal fórum para a troca de experiências, proposição
de políticas e formulação de ações relativas ao campo da preservação
audiovisual.
Ouro Preto, 7 de setembro de 2020.
Associação Brasileira de Preservação Audiovisual – ABPA
Foto: Reprodução Universo Produção