A Fundação Cultural Palmares (FCP) completou 35 anos na terça-feira (22/8) e uma série de ações marcaram o aniversário da entidade vinculada ao Ministério da Cultura (MinC). Ganham destaque o lançamento da 2ª edição do Prêmio Jovem Quilombola Inovador, com investimento de R$ 540 mil e a conclusão do processo de certificação de 59 quilombos.
“Celebrar os 35 anos da Fundação Palmares é, também, celebrar toda a contribuição do povo negro para a cultura brasileira, é reverenciar uma instituição fundamental para a construção de uma sociedade mais equilibrada e justa. Junto da retomada do MinC, estamos atuando na reconstrução da Palmares e de tudo que ela representa”, afirma a ministra da Cultura, Margareth Menezes.
O Prêmio Jovem Quilombola Inovador foi lançado no dia 23/8 visando a selecionar 30 projetos de alunos de comunidades quilombolas. Cada contemplado receberá R$ 18 mil, somando R$ 540 mil. Os participantes devem ser beneficiários do programa Bolsa Permanência, matriculados de 1° de janeiro de 2018 a 31 de dezembro de 2022.
O concurso busca impulsionar a criatividade de alunos
quilombolas em suas atividades acadêmicas de graduação. Os projetos devem estar
voltados à melhoria das condições de vida e ao etnodesenvolvimento das comunidades
quilombolas, com temas ligados ao uso tradicional da biodiversidade, inovação e
tecnologia sustentáveis, manifestações culturais afro-brasileiras, etnoturismo,
empreendedorismo autogestionado e projetos pedagógicos de entidade quilombola.
Também no mês do aniversário, a Palmares lançou o edital
Sabores e Saberes da Gastronomia Quilombola. O objetivo é fortalecer as
práticas culinárias das comunidades remanescentes de quilombos, além de dar
visibilidade a saberes e costumes gastronômicos. Serão premiadas 50
iniciativas, com R$ 20 mil cada. As inscrições vão até 22 de setembro.
Os programas e editais lançados durante o processo de reconstrução do MinC respeitam questões de raça, gênero e origem social, incluindo indígenas, negros e quilombolas, a exemplo dos editais Ruth de Souza, propostas de longas-metragens dirigidos por mulheres estreantes, e o Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura e Literatura Produzida por Mulheres 2023, para trabalhos inéditos escritos por mulheres.
Os editais Sérgio Mamberti e Pontões de Cultura, a serem lançados em setembro, também dialogam com essas temáticas e foram elaborados com apoio da própria Fundação Palmares.
Em parceria com a Secretaria de Direitos Autorais e Intelectuais (SDAI) e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), a Fundação Cultural Palmares também participará de projeto de capacitação em propriedade intelectual voltado para mulheres quilombolas, com o intuito de valorizar os seus conhecimentos e expressões culturais tradicionais passíveis de aproveitamento econômico. O objetivo é agregar valor, utilizando-se dos instrumentos da propriedade intelectual, em potenciais atividades, técnicas, fazeres e produtos vinculados ao seu contexto cultural tradicional. Além disso, a proposta tem o objetivo de construir narrativas que fortaleçam a identidade cultural dessas comunidades. Atualmente, a SDAI e a FCP estão na fase de escolha das comunidades beneficiárias do projeto, com início ainda neste semestre.
A Palmares também integrará um grupo de trabalho interno do Ministério da Cultura (MinC), que terá o propósito inicial de discutir as bases de um novo marco legal de proteção dos conhecimentos e das expressões culturais tradicionais, conforme previsto no Plano Nacional de Cultura (PNC). A intenção é que, uma vez alcançado um amadurecimento do tema no âmbito interno do MinC, a discussão seja ampliada, incluindo outros órgãos de governo e representantes da sociedade civil, particularmente, os representantes das comunidades tradicionais.
Novas certidões
A FCP, também, festeja a conclusão dos processos de certificação de quilombos, no período de janeiro a agosto de 2023, totalizando a emissão de 59 certidões, beneficiando 72 comunidades nas regiões Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul. Em ato nesta terça, no Parque Memorial Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, em União dos Palmares, Alagoas, com presença do presidente da entidade, João Jorge, foram entregues certificações às comunidades Sítio Poços do Lunga e Alto dos Capelas.
O documento reconhece oficialmente os quilombos, garantindo o acesso às políticas públicas direcionadas aos quilombolas e é a primeira etapa para a titulação das terras em que vivem. O Censo 2022 aponta que esta população no país é de mais de 1,3 milhão de pessoas. No total já foram emitidas 2.955 certificações, para 3.637 comunidades.
Símbolo de resistência
A Palmares nasceu em 1988, ano da promulgação da nova Constituição federal e, também, do centenário da abolição da escravatura. Seu nome faz referência ao Quilombo dos Palmares, maior símbolo da resistência contra a escravidão no país. A defesa das ações afirmativas com o intuito de pôr fim às desigualdades e a discriminação racial tem sido uma das bandeiras da entidade.
Primeiro presidente da FCP, de 1988 a 1990, o advogado Carlos Alves Moura, destaca a missão da instituição. “Ao longo de sua história, a Palmares desempenhou importantíssimo papel mediante suas atribuições de promover o resgate, o estudo, a pesquisa e a divulgação dos valores culturais africanos e afro-brasileiros presentes na sociedade brasileira. E contribuiu para que a população pudesse encontrar mecanismos para a superação do racismo”, afirma ele, que esteve à frente da entidade de 2000 e 2003.
Atual mandatário da Fundação, João Jorge diz que a trajetória do órgão “é uma epopeia de 35 anos de uma instituição federal que trata dos interesses de 102 milhões de afro-brasileiros. Povo que fez deste país uma nação rica”.
Carlos ressalta que nos últimos tempos a FCP foi vítima de uma ação de desmonte. “Há quatro anos, a Palmares sofreu uma queda devido a uma administração que buscou destruí-la. Hoje, o Governo Federal inicia a retomada das atividades culturais do Brasil. A Palmares, no entanto, não deixou de existir nas consciências do movimento negro. Mesmo com toda campanha contrária, permanece reconhecida por todos que desejam um Brasil democrático”.
Programa
A Palmares desenvolve ainda ações como o programa Bolsa Permanência, que fornece apoio financeiro a estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica, sobretudo indígenas e quilombolas, matriculados em instituições federais de ensino superior. Neste mês, a Fundação finalizou o mapeamento das declarações emitidas para o acesso ao programa, totalizando 1.375 beneficiários. A entidade contempla ainda iniciativas culturais como o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, implantado em 2007 na Serra da Barriga, área tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1986 e reconhecida como Patrimônio Cultural do Mercosul em 2017.
Também é parceira da Fundação Roberto Marinho (FRM) no A Cor da Cultura, programa de valorização da cultura negra e da cultura indígena. A ação engloba o Projeto Tecendo Saber - Alfabetização e Família, iniciativa da FRM com a secretaria de Educação de Goiás, Instituto Humanize e Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. O objetivo é proporcionar a jovens e adultos a escolaridade formal do primeiro segmento do Ensino Fundamental para reduzir a desigualdade.
Graças à iniciativa, uma turma de estudantes do Quilombo Kalunga, em Goiás, concluiu o Fundamental. Entre os alunos, com idades de 35 a 80 anos, do município de Cavalcante, muitos jamais tinham pisado numa sala de aula e outros estavam afastados há mais de duas décadas. “Este projeto traz esperança a quem não teve a chance de estudar, sobretudo as pessoas mais velhas”, defende o prefeito da cidade, Vilmar Kalunga, que atuou como professor na ação. “A parceria com a Palmares é fundamental. A Fundação quase acabou nos últimos anos e hoje está renascendo e se fortalecendo. Isso é muito relevante, pois ela é a entidade que representa o povo quilombola”, completa.
Fonte: Ministério da Cultura